“Manifesto Sururu” do
sociólogo alagoano Edson Bezerra diz:
“...O Manifesto Sururu quer muito pouco. Quem
sabe um pouco mais do que exercitar um certo olhar: um olhar atento por sobre
as coisas alagoanas...O manifesto sururu também fala da fome. Não da fome
comum, mas da fome de devorar as Alagoas... Novas rotas. Rotas alagoanas: de
canais e lagoas, sobretudo. O manifesto sururu não está sozinho... está atento
para os batuques noturno dos terreiros periféricos e fora de rota e também dos
milhares de capoeiras espalhados. O manifesto sururu se alegra com a folia dos
meninos de rua, com os guerreiros e com as tradições alimentadas pelos povos
periféricos...” .
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Sítio da família herdado do português Rutilio Taveiros, meu bisavô |
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Brincadeira de infância no porto das canoas de águas
límpidas, braço do Riacho Carrapatinho, hoje poluído |
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Hora de despinicar o gordo sururu
com tio Fernando |
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Casa original de Rutilio Taveiros |
Quando ouvi o texto pela primeira vez me arrepiei. Aquilo tinha haver com minha terra, meu pensamento até minha infância! Muitos se identificarão, pensei e passei do devaneio à visitação. Aí, saiu:
Retornando no tempo e ao lugarejo de minha infância, periferia de Maceió, de nome antigo Carrapato, o local de famílias simples e de minorias afrodescendentes e
indígenas se perdeu no tempo às margens da Lagoa Mundaú. Contato direto com a
natureza, o então Carrapato era local de beleza e festividades. Lá não se
produzia nada, só a paz que a natureza transmite, a beleza da fauna, da flora e
das festividades locais! Hoje é área de proteção ambiental que abastece as
torneiras d’água de Maceió, a APA do Catolé.
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A estação do trem do Rio Novo |
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Igreja de N. Senhora da Conceição de 1930
em frente da estação |
O Carrapato, vilarejo pesqueiro
lagunar distante 26 km de Maceió, foi, certamente, região de ocupação
quilombola dos negros fugitivos dos engenhos de Maceió e Marechal
Deodoro (cidade histórica) para o território livre dos quilombos na Serra
da Barriga em União dos Palmares - no chamado território da “Civilização
do Açúcar”. Manifestações locais de cultura popular e de tradições afro
confirmam.
Local rico em folguedos alagoanos
(hoje sem representação oficial expressiva por falta de recursos e
empreendedorismo) e resquícios da nossa história. Local de cultura e culinária de
origens africana e indígena, da pesca, do molusco sururu, do peixe e demais
riquezas de nossas lagoas.
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Se borda e se aprende o filé na escola |
Região de paisagens bucólicas, vasto
coqueiral e Mata Atlântica preservada. Chegava-se lá por trem ou canoa
e posteriormente pela rodagem que o ligava aos antigos bairros maceioenses, que
em tempo próspero da fábrica de algodão “Carmen” absolveu a mão-de-obra local,
hoje fechada. O Carrapato era um povoado de fartura que fazia da Lagoa Mundaú
sua vida.
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A retirada do sururu na Lagoa Mundaú é meio de vida
dos moradores do Rio Novo |
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O sururu é riquíssimo em ferro e minerais e muito saudável ...
se não tiver sido retirado de águas poluídas |
A infância tinha histórias de casa de
paredes largas com “botija” de moedas de ouro e talheres portugueses; de assombrações
da Mata Atlântica, dos mitos folclóricos, como o saci, a mula-sem-cabeça, o lobisomem;
de estórias de pescador; de bolos de massa puba e tapiocas, de quintais com muita fruta-pão,
pitomba, jaca, coco, mangaba, carambola, jambo, caju e macaxeira; do cheiro da fumaça
dos fogareiros de casca de coco para espantar os mosquitos; de apitos e apostas
de corrida com o trem que passava na porta de casa; de visitas proibidas aos
terreiros de candomblé para ver a “pomba gira voar” (que nunca aparecia); de
boiadas entrando terreiro adentro; de estaleiros de canoas feitos sob encomenda;
de banhos e passeios de canoa no braço do riacho Carrapatinho e de reuniões comunitárias
com cantorias para se “despinicar” o sururu que chegava aos latões ainda
na lama. O sururu é riquíssimo em minerais e ferro, e os bebês e crianças
rechonchudas do Carrapato, tinham do mingau feito no caldo do sururu, sua maior
refeição. A capotada do sururu, reunia todos sempre com muito festejo. Depois
tinha quebra-pote, pau-de-sebo, corrida-de-saco e fita de São Gonçalo. Eventualmente,
após a chegada da energia elétrica, na Praça Leonildo Cardoso
da Escola Pedro Café, com televisão comunitária, assistia-se a um
bom filme.
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A turma do bordado alagoano, o "filé" |
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Às margens da Lagoa Mundaú |
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A capoeira é incentivada |
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Praparando para o "Maculelê" |
Hoje, a despeito das famílias antigas
do lugar, novos moradores e sua gente simples, esse bairro ainda desprovido de
boas políticas públicas, de educação ambiental e de geração de emprego e renda é
tratado como baixa periferia, zona de exclusão social, de desmatamento da mata
ciliar do Riacho Carrapatinho, de questões de assoreamento e poluição da Lagoa
Mundaú e do nosso sururu, de lixão a céu aberto e de violência nos seus
conjuntos populares. Contraditoriamente, na área de proteção ambiental, e de
grupos folclóricos autênticos (guerreiro, baianas, coco de roda, pastoril e
grupos de capoeira e maculelê), a presença do poder político só trouxe pequenas
melhorias e um frágil e desordenado crescimento econômico para a região.
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Rua do Cravo como antigamente |
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As famílias de ontem assumiram
a associação do morados |
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Todos participam da limpeza da lama
do sururu no porto das canoas |
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A mesma velha e boa ponte de ferro do trem |
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O encontro emocionado com Lia |
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Lia, a professora aposentada que mantem seu Cantinho da Leitura |
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Os exemplos para os jovens de hoje:
Toinho, Lia e Moges |
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A Escola local |
Mas, àquelas famílias com raízes da “senzala”
e costumes da “casa-grande” continuam habitando a região e merecendo acreditar
que os valores de sua identidade étnica cultural, a beleza cênica e a
abundância de alimentos são seus direitos de cidadão local.
Com duas escolas municipais, um mini
posto de saúde, delegacia desativada e filhos de antigos mestres de folguedos –
Mestra Virgínia e Mestre Murilo Arão, o potencial natural e cultural do agora bairro do Rio
Novo precisa ser valorizado e entregue aos seus habitantes com ações de
cidadania como a inclusão digital, resgate da cultura popular, educação
ambiental, esportes e da valorização da identidade cultural. Notadamente
através da Associação Comunitária dos Moradores e Amigos do Rio, dos habitantes
do alto da Igreja de N S da Conceição (1930) na Rua do Cravo (bucólico
até no nome!) entre a Estação de Trem do Rio Novo e a Escola
Pedro Café. O novo Rio Novo recebe inclusive o trem VLT mas não tem garantido os quatro pilares da sustentabilidade há anos: crescimento econômico, financeiro e social!
As fotos documentam o lado pouco valorizado por gestores públicos no Rio Novo. E voltando ao devaneio, procuramos investidores sociais para projeto de incentivo ao crescimento econômico e à valorização da identidade cultural do lugarejo.
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O caldo de cana de ontem e de hoje |